Ela sempre foi uma boa amiga. A melhor.
E Isla falhou com ela. Estava alcoolizada e mal-humorada em sua varanda quando a amiga mais precisava dela. Ela havia deixado Celeste sozinha na festa, sabendo dos riscos.
Isla sentiu o ar mudar quando Grim apareceu, na seguran?a de um dos c?modos mais próximo dos jardins. Finalmente.
— Preciso que você fa?a algo para mim — ela disse, sua voz enfim estável.
— Qualquer coisa.
Ela respirou como se houvesse furos em seus pulm?es.
— Quem a atacou vai voltar para terminar o trabalho. Preciso que você a fa?a desaparecer até que ela acorde.
Isla ficou grata quando ele n?o questionou seu pedido. Grim simplesmente assentiu.
E, um momento depois, o corpo de Celeste desapareceu.
CAPíTULO QUARENTA E SEIS
VENENO
Tudo mudou em um instante. Agora, Isla n?o estava apenas lutando por si mesma, ou Terra, ou seu povo.
Estava lutando por Celeste.
Lágrimas escorriam pelo seu rosto quando ela deixou o castelo logo após o amanhecer. Isla havia falhado com sua amiga, de muitas maneiras, e n?o tinha se dado conta disso até aquele momento. Assistir à Terra morrer lentamente deveria tê-la lembrado de que a amiga sofreria o mesmo destino se elas n?o fossem bem-sucedidas. Em vez disso, ela abandonou rapidamente o plano que passaram anos formulando. Em parte, porque n?o beneficiaria o seu reino. Ela n?o tinha pensado em Celeste.
Isla n?o podia consertar o passado, mas podia tentar ajudar Celeste agora.
Oro afirmou que ela n?o poderia ser curada pela habilidade Lunar… mas talvez pudesse ser curada com algum remédio Selvagem.
Logo ela estava atravessando um caminho coberto por grama. Por uma floresta que parecia determinada a marcar mil vezes sua pele. Atravessando uma ponte perigosa.
Até que se viu refletida na floresta estéril. De frente para o Palácio de Espelhos.
Ela precisava abrir aquele cofre. Por qualquer meio necessário. Poderia haver remédios antigos dos Selvagens lá dentro, plantas capazes de retirar o veneno que atacava Celeste. Ela n?o tinha visto nenhum no oásis aonde Oro a tinha levado muitas semanas atrás, mas talvez eles tivessem sido trancados ali.
Isla sabia que a porta queria que ela a abrisse por um motivo. Talvez fosse isso.
Ela caminhou em ritmo constante até a parede, planejando n?o ir embora antes de descobrir como abrir a fechadura. Era uma forma estranha e comprida. Primeiro, ela tentou com os dedos. Os colocou de forma dolorosa, enfiando parte da palma na fechadura, para preencher os buracos, mas, quando tentou torcer a m?o, tudo o que ela fez foi gritar enquanto a pele prendia no metal. Levou quase uma hora para se soltar, e, a essa altura, havia cortes na m?o que pingavam sangue.
Isla n?o desistiu. Vasculhou todos os c?modos do enorme palácio que tinha sido sua casa durante semanas. Havia armas estranhas e curvas. Instrumentos que ela n?o sabia tocar. Um deles, uma caixa fina de madeira com buracos, Isla empurrou na fechadura com tanta for?a que quebrou. Ent?o, ela passou um tempo tentando tirar as farpas, cortando os dedos novamente no processo.
Ao meio-dia, ela estava furiosa.
Jurando voltar, retornou para o castelo de m?os vazias.
Isla queria matar Cleo havia muito tempo. Principalmente depois da tentativa de assassinato no porto.
Mas agora… vendo Celeste sem vida, flutuando como um espectro, envolta em névoa…
Agora queria matar Cleo e que fosse uma morte dolorosa.
Isla estava pensando em todas as maneiras que ela faria a governante Lunar sofrer ao pisar na Ilha da Lua com Oro ao seu lado.
Mais dois lugares, ela disse a si mesma. Celeste n?o podia mais jogar. Isla teria que jogar pelas duas; garantir sua vitória e salvar o reino da amiga. Isso era tudo o que importava agora.
Apenas mais dois lugares onde procurar.
A neve caía rápida como chuva, encharcando o topo de sua cabe?a e escorrendo em linhas por suas bochechas. Desta vez, ela usava uma capa grossa por cima da camisa de mangas compridas e da cal?a para se proteger do frio. Mesmo assim, n?o adiantou muito, e Isla n?o se afastou muito de Oro, que irradiava calor como um sol que havia descido do céu.
Logo, chegaram a uma torre em uma montanha de neve. Oro escalou sua única entrada, uma janela, e ela o seguiu para dentro, descendo, atravessando um corredor, até se dar conta de que n?o estavam em uma torre.
Estavam em um palácio.
Era abandonado, mas ainda adornado, feito inteiramente de mármore branco. Eles haviam entrado de seu pico mais alto; o resto estava enterrado no gelo, preso no eterno inverno que era a Ilha da Lua. Ela seguiu Oro andar por andar até chegarem ao topo de uma grande escadaria.
Os largos degraus levavam ao que outrora devia ser o andar principal.
Agora estava completamente debaixo d’água.
De alguma forma, a mobília permaneceu presa; tudo no c?modo abaixo parecia estar perfeitamente no seu lugar. Apenas… submerso.
Oro come?ou a tirar as roupas.
Isla se virou para encará-lo.
— O que você está fazendo?
Ele a encarou.
— Existem criaturas naquela água que n?o ser?o fáceis de enfrentar. N?o preciso carregar mais peso ou dar a esses monstros algo com o que me sufocar. — Sua capa agora estava descartada no ch?o. A camisa logo se juntou a ela.
Isla ficou o encarando, embora tudo em sua mente dissesse para n?o fazer isso. Oro era extraordinariamente parecido com as estátuas de mármore na Ilha da Lua, seu peito e bra?os musculosos como um guerreiro, tonificados como uma lamina.
Mais da metade de seu corpo já havia sido tomada pelo cinza-azulado. Ele era parte ouro, parte escultura de gelo. Isla o observou, imaginando se doía perder os poderes, morrer lentamente, centímetro por centímetro.
Ela o observou por outros motivos também.
Oro virou-se para ela, surpreso.
— Tenho certeza que você já viu muitos corpos antes — ele disse, sem rodeios.
Isla se irritou. Ele n?o tinha dito isso de forma maliciosa, mas tranquilamente, e ela n?o podia culpá-lo por sua suposi??o. Um verdadeiro Selvagem, mesmo um sem poderes, já teria visto incontáveis corpos nus. Eles eram famosos por suas conquistas romanticas.
Um fato, nada mais.
Isla engoliu em seco.
— Claro que sim — ela disse, um pouco rápido demais.
Oro ergueu uma sobrancelha, percebendo que a ausência de uma maldi??o n?o era a única coisa que a distinguia de seu povo.
Ele deu um passo à frente, ainda sem camisa. Inclinou sua cabe?a dourada para ela.
— Diga-me, Selvagem… com quantas pessoas você já esteve… intimamente?
O rosto de Isla corou. Ela mal resistiu à vontade de esbofeteá-lo.
— Que tipo de pergunta é essa? — ela quis saber. Em seu reino, o amor era proibido, mas a intimidade n?o era evitada. Era celebrada.
Ele parecia saber disso, e sua express?o ficou ainda mais surpresa.
— Curiosidade. — Ele encolheu os ombros. — Já estive com muitas mulheres. N?o é algo que nego.
Isla zombou dele, bufando.
— Bem, isso deve ter sido há muito tempo, a julgar por qu?o tenso e insuportável você é.