— Vou levá-la assim que encontrarmos o cora??o — ele repetiu.
Seu tom foi definitivo. Isla sabia que ele n?o mudaria de ideia, e estavam longe de encontrar o cora??o. Ela n?o podia esperar. N?o a uma semana do baile. N?o quando os nobres Lunares quase conseguiram assassiná-la antes do evento. O recado na pra?a podia ter sido um truque, mas era verdade. Ela estava em perigo.
— N?o — ela disse, rindo sem humor. Sentiu sua sanidade se esvaindo ao redor. — Sabe de uma coisa? Estou farta. De você, desse plano. — Sua voz ficava mais alta e mais selvagem quanto mais ela falava, mas ela n?o se importou. — Eu sangrei. N?o tenho dormido. Fui possuída. Tive o profundo desprazer de ficar junto de você por muito tempo. Estou farta. Nosso acordo está cancelado. E adivinha? N?o preciso de você para entrar na sua ilha, rei — ela zombou. — A menos que você queira me impedir?
Ela manteve os olhos fixos nele. Desafiando-o a negar seu acesso.
Ele n?o o fez.
— Bom. Talvez eu vá durante o dia, ent?o — ela disse, m?os em punhos ao lado do corpo. Ela falou as últimas palavras bem na cara dele antes de passar na sua frente. — Dessa forma, terei suas terras só para mim.
CAPíTULO TRINTA E UM
FOGO
Terra sempre repreendeu Isla e suas emo??es. Ela estava certa.
Seus sentimentos ser?o sua ruína, disse inúmeras vezes.
Eles a deixavam fraca e vulnerável.
E, agora, tinham arruinado seu plano de ter acesso à biblioteca da Ilha do Sol.
Ela n?o devia ter ficado t?o brava com o rei. N?o devia ter esperado que ele fosse qualquer coisa além de insuportável.
Claro que ele iria usar suas palavras contra ela. Claro que deixaria um espectro usar seu corpo para seus propósitos e ainda, sim, negar-lhe um simples pedido.
Isla tinha feito tudo errado. Agora sabia disso, mas se recusava a dizer para Celeste que havia falhado. De novo. N?o quando a amiga tinha se esfor?ado tanto para conseguir as luvas.
Ela n?o desistiria. Ainda n?o.
A Ilha do Sol estava vazia durante o dia, como esperado. N?o havia ninguém para encarar boquiaberto seu vestido vermelho vivo. Ela n?o se preocupou em usar uma tonalidade mais neutra. Qualquer tom que n?o fosse ouro se destacaria imediatamente.
A ilha era dourada, assim como seu rei. Ouro em todos os lugares. Isla n?o perdeu tempo olhando e demorando-se em suas maravilhas, e marchou com determina??o direto para o castelo.
N?o se importava se todos os guardas do palácio tentassem detê-la; ela entraria naquela biblioteca de qualquer jeito.
Assim que adentrou o castelo, a luz do sol do lado de fora desapareceu. A única claridade vinha das esferas de fogo e dos candelabros. As chamas enchiam cada centímetro do teto, fazendo o que o rei n?o podia.
— Isla, governante dos Selvagens?
Ela se virou para o guarda que a havia cumprimentado, pronta para dizer que ele n?o iria impedi-la de entrar. Que ela tinha permiss?o para estar aqui, mas, antes que ela pudesse fazer isso, ele continuou: — Estávamos esperando por você. Por favor, siga-me.
A armadura dourada do guarda tilintou quando ele se virou e desceu pelo corredor.
Esperando por você? Ela foi atrás dele.
— Estavam? — ela perguntou, olhando ao redor com cuidado, esperando ver mais guardas em breve. Possivelmente para ser levada para algum tipo de masmorra.
Ele assentiu.
— Recebi ordens para levá-la à biblioteca.
Isla ficou em silêncio. Isso n?o poderia estar certo… Tinha levado três dias para reunir coragem para se aventurar na terra Solar. O guarda a esperava bem na porta. N?o havia como ele ou qualquer outro estar esperando por ela.
Em pouco tempo, ele parou em frente a uma entrada.
— O rei ordenou que a biblioteca ficasse fechada esta semana. Você estará sozinha e terá acesso total a todos os andares.
Ela piscou. Oro tinha se recusado a trazê-la aqui ele mesmo, mas tinha lhe dado privilégios exclusivos?
Tinha que ser um truque.
Se bem que, desde que pudesse procurar na biblioteca… ela n?o se importava. Isla abaixou a cabe?a em agradecimento, for?ando um sorriso no rosto como se tudo fosse normal e esperado.
— Obrigada — ela disse.
— Estarei aqui se precisar de alguma coisa.
As portas da biblioteca se fecharam atrás dela com um baque.
O guarda estava certo. Isla tinha o espa?o todo só para ela. Dez andares de livros. Galerias t?o longas que ela n?o conseguia ver o fim.
Se n?o tivesse uma tarefa específica, adoraria passar os dias ali, explorando.
Mas n?o foi por isso que ela havia batalhado tanto para entrar nesta sala.
Isla foi em frente, sem saber se mais guardas viriam prendê-la, ou se o próprio rei iria aparecer a qualquer momento para exigir que ela dissesse o que estava procurando.
Ela tirou as luvas Estelares de um bolso escondido em sua capa e as vestiu com um toque de avers?o. Com t?o pouco tempo, ela precisava tocar em tudo e torcer para ter sorte.
Os livros eram lindos. Suas capas eram douradas, com pedras preciosas nas lombadas. O conhecimento parecia ser valorizado na Ilha do Sol.
Dezenas de mesas preenchiam o espa?o, diferente de qualquer outra biblioteca que ela havia visitado na ilha. Isso significava que os Solares tinham acesso total ao seu interior?
N?o havia tempo para pondera??es. Ela procurou por qualquer coisa fora do lugar, qualquer coisa que parecesse especial.
No fim do corredor havia uma lareira, grande o suficiente para engoli-la inteira. As chamas dentro crepitavam, quase como um aceno.
Ela parou na frente dela.
A se??o restrita dos Etéreos ficava no topo da torre, bem alto no céu. A dos Lunares ficava coberta de água.
Talvez a se??o restrita dos Solares estivesse escondida nas chamas.
Antes que ela pudesse pensar melhor, Isla estendeu uma luva para o fogo, sabendo que ela poderia muito bem derreter. Preparou-se para a dor e o cheiro de camadas de carne queimando.
Isso n?o aconteceu. O fogo desapareceu imediatamente e ela entrou na boca da lareira. Pressionou a outra m?o na parede de pedra. E observou o tijolo cair.
Seu peito estava muito apertado. A garganta muito seca.
Era isso. A última biblioteca. O último lugar para procurar.
E entrou.
Os Solares tinham mais relíquias do que qualquer um dos outros reinos juntos. Havia prateleiras delas, guardadas na quase escurid?o.
Isla n?o perdeu tempo.
Foi minuciosa. Pegou todos os encantamentos no c?modo. Segurou por alguns segundos. Separou alguns, certificando-se de que nada estava escondido dentro. Havia dezenas.
Nenhum deles parecia uma agulha gigante.
Nenhum, além de algumas espadas, tinha pelo menos uma ponta.
N?o. De jeito nenhum. Elas vasculharam todas as bibliotecas de Lightlark. O texto dizia…
Dizia que o desvinculador estava em uma biblioteca séculos atrás.
Tempo mais do que suficiente para ter desaparecido.
Ou ter sido destruído.
Ou talvez… nunca tivesse existido.