Sua m?o conseguiu agarrar um caco de vidro do ch?o, ent?o o mundo virou de lado quando ela foi lan?ada contra um velho navio.
Isla sentiu gosto de sangue na língua; a cabe?a pulsava. A m?o do homem apertava seu pesco?o, levantando-a. Ela ouviu um rugido que n?o era o mar e fez um som terrível quando tentou respirar.
Ainda assim, sorriu.
Talvez n?o fosse grande coisa acorrentada.
Mas as correntes haviam desaparecido agora.
Isla apertou o longo caco de vidro entre os dedos e o enfiou na garganta do homem.
Ele a soltou imediatamente, tocando o próprio pesco?o, tentando falar. Nenhuma palavra saiu de sua boca.
Os outros nobres Lunares n?o se saíram melhor. Ela correu de volta para Celeste, apenas para encontrá-la parada no meio de uma confus?o de mortos caídos nas pedras molhadas do porto.
— Ela tentou te matar — disse Celeste, a voz surpreendentemente firme. — Você precisa deixar uma mensagem. Uma que mostre sua for?a. Uma que a fa?a pensar duas vezes antes de tentar de novo.
Juntas, elas rabiscaram uma resposta com sangue.
Quando terminaram, Isla olhou para baixo e sorriu. Antes aquilo talvez tivesse lhe dado vontade de vomitar, mas estava na ilha havia quarenta dias. Nesse tempo, havia duelado com governantes famosos, sobrevivido a inúmeras prova??es, suportado dores indescritíveis, arrancado espinhos das costas com as próprias m?os. Sua postura era ereta e firme, lembrando-se dos homens que a amea?aram. Lembrando-se de como se sentiu fraca acorrentada. Impotente contra o poder. Nunca mais, ela prometeu a si mesma.
Vai precisar se esfor?ar mais, dizia a mensagem.
CAPíTULO VINTE E OITO
PALáCIO DE ESPELHOS
Nunca antes Isla quis tanto ter poderes. Primeiro, os espinhos. Depois, a tentativa de assassinato no porto, a prova de que suas laminas significavam pouco em Lightlark.
Contudo, elas serviram bem como uma válvula de escape para a raiva que se agitava em seu interior como uma tempestade.
Depois da tentativa de assassinato, Isla havia marchado direto para a loja Estelar e comprado uma adaga. A arma tinha uma cobra enrolada ao redor do punho, digna de um Selvagem. Ela a segurava com for?a, cortando o ar como se o metal n?o tivesse peso. Isla girou a lamina entre os dedos, a jogou no ar e apanhou de volta sem ter que olhar. Imitou o ato de esfaquear alguém bem no est?mago.
Os nobres Lunares vieram em sua mente, e ela enfiou a lamina através do ar, através deles.
Seus lábios se curvaram. Ela esfaqueou todos eles, um por um, os homens e as memórias.
— O vento fez algo para ofendê-la?
Isla girou em um instante e a adaga voou, perfurando a pedra do palácio logo acima do cabelo escuro de Grim.
Ele sorriu. Com um movimento fluido, arrancou a adaga e atirou de volta para ela.
Isla a pegou sem que seu olhar deixasse o dele.
Grim.
Sentiu um frio no est?mago ao vê-lo. Depois, a raiva aumentou. Ela o encarou.
— Nunca pensei que o governante de Umbra seria t?o indeciso.
— Indeciso?
Isla deu um longo passo na dire??o dele.
— Indeciso. Você parece n?o conseguir se decidir. Um dia, você age como se f?ssemos amigos, e no outro, estranhos. Desaparece por semanas.
Grim n?o se esquivou de seu olhar.
— Qual você prefere? — ele perguntou, como se realmente quisesse uma resposta. — Amigos ou estranhos?
Ela engoliu em seco, implorando para que suas emo??es ficassem sob controle.
— Nenhuma das op??es — ela mentiu. — Só quero que você fique longe de mim.
Ele deu um passo em dire??o a Isla e sorriu. Só um pouco.
— é realmente isso que você quer, Devoradora de Cora??es?
Ela perdeu o f?lego. Grim sentiu tudo.
Isla se virou antes que ele pudesse perceber mais.
O sorriso de Grim desapareceu. De repente, ele ficou muito sério.
— Nós realmente devemos ficar longe um do outro — disse ele. — é por isso que n?o me viu mais.
Ent?o ele estava mesmo evitando Isla.
— Por quê? — ela perguntou, embora pudesse supor mil motivos.
Ele deu de ombros.
— Eu sou o famoso guerreiro Umbra, milhares de mortes na minha lamina. Todos me odeiam. Ninguém confia em mim e por uma boa raz?o, n?o deveriam. — Ele olhou para Isla. — Você n?o deveria confiar em mim.
Ela queria perguntar o que ele queria dizer, mas, antes que pudesse, Grim deu mais um passo. O cabelo de Isla estava bagun?ado em torno do rosto, e a camisa parecia apertada demais contra a pele; ela estava usando uma cal?a e uma camisa para treinar. Mesmo que seus vestidos fossem todos feitos para uma sedutora fatal, naquele momento as roupas de treinamento pareciam muito mais reveladoras.
— Você sabe como é ser odiado, n?o sabe, Devoradora de Cora??es? Ser visto como um monstro? Um bárbaro?
Era verdade. Ainda assim, doeu ouvir a verdade.
— Está ficando irritada, Devoradora. Vai negar o que você é?
Ela estava com a respira??o ofegante e nem mesmo sabia o motivo.
— N?o. E você?
Grim balan?ou a cabe?a. Ele deu um passo na dire??o dela.
— Nunca. Eu sou o monstro.
Isla sabia que deveria fugir ou fazer algo além de dar um passo para mais perto. Ele inclinou a cabe?a. Algo sobre o jeito que ele a olhava, o jeito que ficava t?o perto. Mais do que alguém jamais ousou chegar.
— N?o sou seu inimigo — disse ele, a voz mais suave do que já tinha ouvido.
Ent?o por que ela n?o podia confiar nele? Por que ele a afastava?
E por que ela se importava?
— Prove — ela se atreveu. — Conte-me algo.
— O que você quiser.
Ela se lembrou das palavras do rei na floresta. O motivo pelo qual o resto dos governantes n?o tinha simplesmente decidido matar Grim para cumprir a profecia.
— Oro disse que você é a única coisa entre nós e um perigo maior. Do que ele estava falando?
Grim n?o pareceu nada surpreso com a pergunta. Mesmo assim, demorou para responder.
— Há coisas piores neste mundo do que as maldi??es. Ou até mesmo eu.
— Como o quê?
Ele balan?ou a cabe?a.
— Eu poderia te contar, mas isso só iria te distrair. Pode acreditar. Agora, as maldi??es s?o o perigo mais premente.
Isla fez uma careta. Quem era ele para decidir o que iria e o que n?o iria distraí-la? O que era demais saber? Ainda assim, ela percebia, por seu tom de voz, que ele n?o iria ceder.
— Está bem. Mostre-me algo, ent?o.
— O que você quiser — ele repetiu, embora as palavras significassem menos, agora que sabia que havia limites.
— Mostre-me onde os Selvagens viviam quando estavam em Lightlark.
O pedido surpreendeu até ela mesma. Isla ainda n?o tinha encontrado a entrada para a Ilha Selvagem. Os comentários de Oro na floresta só aumentaram sua curiosidade. Havia tanto sobre seu reino que n?o sabia.
E agora ela estava mais curiosa do que nunca. Isla queria o poder infinito que seus ancestrais Selvagens outrora possuíam. Talvez tivessem deixado algo para trás, algo que poderia ajudá-la agora.