Isla ficou parada. Ela sabia que os Selvagens tinham sua ilha em Lightlark, é claro. Até procurou por ela enquanto bisbilhotava por aí. Mas n?o tinha encontrado a ponte em lugar nenhum.
— Como sabemos que o cora??o n?o está na Ilha Selvagem? — ela perguntou, subitamente desesperada para vê-la. Oro continuou andando, e ela correu para alcan?á-lo. — Com certeza a maioria das plantas está lá.
O rei a encarou.
— Você mesma disse. O cora??o precisa de um anfitri?o disposto e carinhoso para sobreviver. — Ele deu de ombros. — Toda a natureza na Ilha Selvagem está morta.
Morta. A palavra foi tiro em seu peito.
Ela n?o devia ter esperado nada diferente, mas ainda assim doeu ouvir.
Um instante se passou.
— O que você achava deles? — ela perguntou, embora soubesse a resposta, dada a forma como zombou dela no primeiro jantar dos governantes. — Dos Selvagens.
Ele franziu a testa, e Isla se preparou para uma série de insultos pelos quais ela poderia dar-lhe um tapa.
— Era o meu reino favorito depois dos Lunares — ele respondeu por fim.
Ela zombou.
— N?o está falando sério.
Ele olhou para ela por cima do ombro.
— Eu disse eram, Selvagem.
— Por quê?
Eles continuaram andando. As árvores come?aram a mudar. Ficando mais esparsas. Até que chegaram a uma clareira.
— Os Selvagens eram conselheiros em nossa corte — ele contou. — Quando eu era crian?a, me ensinaram a empunhar uma espada, a colher as frutas certas. Eram leais. Eram bons.
Isla apenas olhou para ele.
— E agora?
— E agora... — Eles entraram em outro bosque, composto inteiramente de árvores-de-caix?o. Centenas delas. — Selvagens s?o todas as coisas que as pessoas dizem.
Passaram a noite inteira descascando e olhando dentro de cada árvore. Oro fez isso sem ter que usar uma faca, gra?as a suas habilidades Estelares. Isla usou as m?os e uma pequena adaga que havia levado escondido para a ilha, disfar?ada de pulseira. A cada corte de sua lamina, ela estremecia, esperando que a árvore retaliasse, mas nenhuma delas tentou machucá-la. Isla trabalhou rápido o suficiente para que Oro n?o sugerisse utilizar seus poderes para a tarefa. A cada hora que se passava, ela ficava mais preocupada, esperando por essa sugest?o.
No final, ele finalmente fez isso.
— Isso seria mais fácil com suas habilidades — disse, franzindo a testa.
Isla congelou, pensando se deveria se preparar para correr, e no que isso a ajudaria.
— Mas as criaturas que isso poderia atrair... n?o tenho certeza de que vale a pena o risco.
Isla se perguntou sobre essas criaturas, as que ele havia mencionado antes. Quem eram e por que odiavam tanto os Selvagens?
Por que até Oro tinha medo delas?
Isla sempre presumiu que os governantes eram os piores do Centenário. Os mais poderosos. Os mais letais.
A maneira como o rei falou sobre essas criaturas antigas fez com que ela acreditasse que isso n?o era verdade. Fez com que se perguntasse qu?o mortais elas poderiam ser.
E também fez com que torcesse para nunca descobrir.
CAPíTULO VINTE E SEIS
ESPINHOS
Fazia dez dias desde a última vez em que Grim a tinha procurado. Ela deveria estar aliviada, mas parte dela esmoreceu diante do fato de que Celeste provavelmente estava certa.
Que outra explica??o ele poderia ter para evitá-la de repente depois de ter ido atrás dela com tanta persistência? Ela realmente era apenas parte de seu plano, seja lá qual fosse.
Idiota, disse a si mesma, por acreditar em qualquer coisa diferente disso.
Era a terceira noite deles na floresta de árvores-de-caix?o. Tinham olhado dentro de centenas de árvores, nenhuma com o cora??o. Isla estava come?ando a achar que n?o tinha prestado aten??o suficiente.
Tinha deixado algo passar? Ela identificou as plantas que tinham mais chance de abrigar o tipo de poder que Oro havia descrito... mas poderia estar errada.
No caminho pelo Continente, fez mais perguntas ao rei. Cada dia com ele era um teste para ver quanto lhe contaria.
— Por que Cleo n?o participou do último Centenário?
Azul havia mencionado isso antes.
A floresta ainda n?o tinha tentado machucá-la, mas Isla ainda sentia sua energia se desenrolando ao seu redor, como se a natureza estivesse simplesmente esperando o momento certo de atacar. Até o rei era cuidadoso por onde andava, sem nunca subestimar o poder da floresta.
— Deveria perguntar a ela. Vocês duas se d?o t?o bem.
Isla poderia ter pensado que era a tentativa de uma piada bem-humorada, e teria ficado surpresa com a possibilidade de o rei fazer uma, se seu tom n?o tivesse sido t?o hostil.
Ela o encarou.
— N?o é minha culpa se virei um alvo desde que fiz aquele comentário no jantar.
O rei balan?ou a cabe?a. Parecia incrédulo diante da tolice de Isla.
— Cleo n?o te mataria só porque n?o gosta de você.
Isla zombou. Ele com certeza n?o tinha visto a maneira como a Lunar a encarava, como se estivesse contando as horas até o quinquagésimo dia do Centenário.
— Você parece tê-la em alta conta.
O rei, para sua surpresa, assentiu.
— Tenho. Cleo pensa no bem de seu reino acima de tudo.
Isla se lembrou da demonstra??o da Lunar. Ela havia testado os desejos deles.
Terra e Poppy tinham pregado o mesmo compromisso implacável com seu povo. Somente em Lightlark Isla entendeu o tamanho do sacrifício que era desistir de tudo o que o mundo tinha a oferecer.
— Sério? — Isla disse, incrédula. — Ela n?o tem hobbies? Amantes?
Oro n?o encontrou seu olhar.
— Ela teve alguns relacionamentos, com homens e mulheres, antes de chegar ao poder — disse ele. — Mas desde que se tornou governante concentrou-se inteiramente no futuro do reino. Seu foco é admirável. — Ele co?ou o queixo. — No entanto, isso n?o significa que ela n?o seja um problema.
Problema. Isla se perguntou se ele sabia sobre a legi?o de Cleo. Seus guardas. Ele devia saber.
— O compromisso com seu próprio reino n?o significa que ela mataria qualquer governante que conseguisse para cumprir a profecia? Para garantir que ela e seu povo n?o morressem?
O rei parou.
— Qualquer governante? — ele repetiu.
Ela deu de ombros.
— O primeiro que ela tivesse a chance de assassinar.
Ele nunca pareceu sentir tanta avers?o a ela como neste momento.
— Você n?o entende, Selvagem? Matar um governante n?o é a parte difícil. Nós todos tivemos várias oportunidades de cumprir essa parte da profecia. Você sabe por que matar n?o é permitido até o quinquagésimo dia?
Ele parecia t?o chateado que ela n?o se atreveu a tentar uma resposta.