— Era por isso que o rei Egan estava se casando com outra governante, n?o era? Para tentar reunir os reinos?
Isla costumava se perguntar se o rei havia decidido, de forma atípica, casar-se com alguém de fora do seu reino por amor. Era assim que Poppy contava a história do rei Egan e Aurora. Um Solar e uma Estelar encontrando o amor, apesar de suas diferen?as. Foi a única vez que sua tutora n?o falou sobre o amor como uma advertência.
— Precisamente. — Azul suspirou. — Agora, aqui estamos, no quinto. — Ele olhou para ela brevemente por cima do ombro, com pena nos olhos. — E n?o sei se terei coragem de comparecer a um sexto.
Isla engoliu em seco ao escutar aquele tom sombrio. Tinha sido um aviso?
Ele estava lhe dizendo que, apesar de sua disposi??o normalmente jovial, ele seria capaz de matá-la se isso significasse que este Centenário seria o último?
Isla estava desesperada para mudar de assunto.
— Você é próximo de seus nobres?
A Ilha do Céu estava surpreendentemente bem conservada. Os nobres pareciam estar fazendo um bom trabalho na ausência de seu governante.
Azul franziu a testa.
— N?o há nobres Etéreos. — Ela deve ter parecido confusa, porque ele continuou: — Estabelecemos uma democracia desde que cheguei ao poder. Os Etéreos que s?o convidados para os eventos menores s?o oficiais eleitos, e todas as decis?es importantes s?o tomadas com base nos votos do meu povo.
Isla piscou para ele.
— Ent?o, se eles decidirem que n?o querem você como governante...
Ele deu de ombros.
— Eu renunciaria. Ainda que isso certamente fosse complicar as coisas, considerando o Centenário e a forma como os nossos poderes s?o transmitidos — disse. — Tenho sorte de eles ficarem felizes com meu reinado.
Ela nunca tinha ouvido falar de um reino sendo conduzido daquela maneira.
Enquanto pensava sobre as palavras de Azul, Isla o pegou olhando para ela.
Analisando-a.
O que estava procurando?
Eles pararam aos pés de uma montanha de aparência peculiar, mas n?o especial o suficiente para valer a caminhada. Azul havia lhe contado muitas coisas, coisas sobre as quais ela n?o esperava que outro governante falasse diretamente durante o Centenário.
Era porque ele sabia que Isla n?o estaria viva para usar o conhecimento que havia compartilhado?
Faltava pouco mais de um mês para o quinquagésimo dia. Isla ficou tensa, imaginando se o Etéreo estava contando as horas para que pudesse matá-la sem quebrar as regras. Talvez seu povo já tivesse lan?ado seus votos, querendo que ela morresse quando chegasse a hora de cumprir a profecia.
Azul apenas olhou para cima, Isla seguiu seu olhar com cautela e viu túneis cavados acima deles, indo até bem alto. Se apertasse os olhos, conseguia ver o azul brilhante do céu do outro lado, em meio à montanha. Ela contou sete, todos alinhados um ao lado do outro, perfeitamente esculpidos na pedra.
— Eu costumava vir aqui com meus amigos quando crian?a — disse ele, sorrindo. Dessa vez, o sorriso alcan?ou seus olhos. — Voávamos pelos túneis o mais rápido quanto conseguíamos, cronometrando nosso tempo. Fizemos disso uma brincadeira.
Fazia quinhentos anos desde que ele havia voado pela última vez. Parecia sentir tanta falta disso quanto Grim sentia da noite e Oro, do dia. Ele virou-se para ela.
— Hoje, os túneis têm um uso diferente.
Ele afastou as pernas e disparou uma rajada de vento para cima com o punho.
Isla recuou instintivamente, ent?o percebeu que o ar estava atravessando um dos túneis. Logo depois, o movimento fez um lindo som.
— é um instrumento — ela disse em voz alta, dessa vez com anima??o verdadeira.
Em resposta, ele lan?ou ar por todos os túneis, um após o outro, rápido como o vento.
Uma melodia atravessou a tarde.
Isla cantarolou junto, radiante. A montanha era um instrumento... Ela n?o podia acreditar. Azul a deixou contente tocando música após música, sem deixar a for?a do ar diminuir. Pouco a pouco a cautela nos olhos dele desapareceu.
Ela se viu feliz por ter encontrado com Azul, mesmo que para um rápido momento de distra??o.
Quando Azul escoltou Isla de volta ao castelo do Continente, estava quase anoitecendo. Grim já teria deixado a pra?a; em vez de encontrá-lo no bar, teria que ir ao quarto dele.
Ela descobrira a localiza??o de todos os quartos dos governantes já fazia muitos dias. Isla poderia ter perguntado a Ella, para poupar horas de investiga??o, mas se sentia mais segura espa?ando seus pedidos, sem deixar ninguém saber muito sobre suas necessidades ou juntar as partes de seus planos. Era mais difícil seguir os governantes pelo castelo sem ser notada, portanto ela havia seguido os criados.
Foi assim que ela descobriu que os aposentos de Grim ficavam do outro lado do castelo, mais distante do que todos os outros governantes. Isla já havia se decidido a encontrá-lo, mesmo com todas as possíveis consequências, mesmo sabendo o que estava colocando em risco. Tinha ido até ali apesar disso.
Mas, de pé na frente da porta, com a m?o a centímetros da pedra, ela hesitou.
Antes de perder a coragem, a porta se abriu.
Grim estava ali, olhando para ela com uma sobrancelha levantada.
— Desculpe por ter fugido — ela disse. Tinha sido mesmo muito rude, depois de toda a ajuda dele. — Vim agradecer, mais uma vez. E oferecer algo em agradecimento pelo... pelo que você fez.
Um sorriso come?ou a tomar conta do rosto dele com a men??o de um agradecimento.
— Ah, é mesmo? — respondeu, a voz ficando ainda mais profunda, de alguma forma.
Isla olhou para ele como se dissesse n?o esse tipo de agradecimento. Grim era um descarado. Será que era assim com todas? Ela era apenas a mais recente vítima de seus flertes?
Aquilo tinha que ser parte do plano. O que só tornou o que ela estava prestes a fazer uma tolice maior ainda.
Seus olhos brilharam de forma dissimulada.
— A minha demonstra??o é a próxima — disse Isla, as palavras saindo de sua boca antes que ela pudesse mudar de ideia. — Amanh?. Exige prepara??o.
O rosto de Grim ficou surpreendentemente sério.
— Devoradora de Cora??es, você n?o precisa...
N?o. Ela precisava. Grim agora sabia um de seus segredos, depois de encontrá-la com a cor dos Etéreos. Ele a ajudou, tornando-a invisível para Cleo. Isla estava em dívida com Grim e n?o gostava disso. Ent?o ela lhe daria a informa??o para acabar logo com isso.
— é para demonstrar o valor do seu reino. Mostrar algo de importante criado por ele, para o futuro de Lightlark.
O Umbra n?o desviou o olhar. N?o sorriu. N?o agradeceu. Simplesmente assentiu.
E ela assentiu de volta.
Só mais tarde naquela noite, encarando o teto em vez de dormir, foi que ela se perguntou se havia cometido um grave erro.
CAPíTULO QUINZE
ELIXIR
Isla lhes deu uma hora.