N?o respondeu à pergunta, mas Isla via a resposta com clareza em seu rosto. Ele sentia repulsa por ela e seu povo.
— Está me fazendo perder tempo — disse ele por entre os dentes. — Temos um acordo ou n?o?
Por um momento, ela pensou.
N?o tinha ideia de qual era a teoria do rei e n?o se importava. O que importava era que a alian?a proposta oferecia algo de que ela precisava.
Sua melhor oportunidade de entrar na biblioteca da Ilha do Sol.
Isla n?o precisava concordar com o plano dele. Só precisava fazê-lo acreditar que ela concordaria.
Ainda assim...
Caso a estratégia de Oro acabasse dando certo, poderia ser um bom Plano B. Ent?o, ela precisava garantir a seguran?a de Celeste também. Mas, se ela perguntasse diretamente, Oro suspeitaria de sua alian?a...
— Temos um acordo se eu puder escolher um segundo reino para você proteger.
A express?o de Oro ficou ainda mais fechada.
— Você tem algum em mente? — ele perguntou.
Ela deu de ombros de forma evasiva.
— Se vou ajudá-lo a quebrar as maldi??es, eu deveria pelo menos determinar mais um reino que merece ser salvo. — Seu sorriso era felino. — E, já que você precisa de mim, parece que temos espa?o para negocia??o.
A mandíbula de Oro ficou tensa. Parecia que ele n?o esperava nenhuma oposi??o. Os sinos soaram, marcando a hora, quase fazendo Isla pular. Oficialmente meia-noite. Quando o som parou, Oro respondeu: — Tudo bem. Temos um acordo?
Era bom decidir por conta própria. Pensar em um plano reserva. Durante toda a sua vida, Isla tinha obedecido aos outros. Suas tutoras. Celeste. Embora elas só tivessem boas inten??es em mente, era libertador fazer essa escolha.
— Combinado — ela disse com firmeza, imaginando em que diabos ela estava se metendo.
— ótimo.
Ela caminhou em dire??o à porta, ansiosa para que a conversa terminasse.
— Quando come?amos?
O rei n?o a seguiu do jeito que ela planejou.
— Agora.
— Agora?
Sua voz soou desesperada. Mas ela precisava de tempo para pensar em uma desculpa para a ausência de seus poderes... para se preparar...
— Algum problema? — ele perguntou, estreitando os olhos.
Ela o encarou.
— Bem, eu tinha planejado dormir. — Falando em dormir... assim t?o perto, ela podia ver que o rei tinha grandes olheiras roxas abaixo dos olhos. Ele nem sequer estava dormindo? Oro n?o se mexeu ou reagiu às palavras de Isla, ent?o ela disse: — Tudo bem. Só deixe eu me vestir. — Ela alcan?ou um de seus novos vestidos. — Se puder esperar lá fora...
Oro franziu a testa para o vestido que ela escolheu, t?o brilhante e revelador como os demais.
— Você n?o pode usar isso.
Quando ainda estava se preparando para o Centenário, Isla estava apreensiva diante da ideia de conhecer o rei. Ela havia se perguntado se ficaria com medo na presen?a dele, ou se ele iria sentir a ausência de poderes e a mataria o mais rápido possível. Agora, olhando para Oro e sua cara fechada em reprova??o, Isla percebeu que sua maior dificuldade era controlar a vontade de estrangulá-lo.
— Agora vai me dizer o que vestir? — ela perguntou.
Oro piscou devagar, irritado.
— Durante nossas excurs?es juntos, ninguém pode saber que você é a governante dos Selvagens.
Isla ficou tensa.
— Por quê?
— Lightlark n?o gosta de você.
N?o me diga. Ainda assim, Isla fez uma careta.
— Como é?
— Algumas criaturas antigas da ilha, as que ainda vivem nos rec?nditos mais profundos de Lightlark, acreditam que os Selvagens os abandonaram cinco séculos atrás. Se sentirem você ou ouvirem rumores de que está perto de suas terras, v?o atacar. O que terminaria em sangue derramado e muita aten??o voltada aos nossos esfor?os.
Ela sabia que os Selvagens n?o eram queridos, mas nunca tinha ouvido falar desse motivo. Abandonados? Os Selvagens sanguinários praticamente fugiram da ilha. Ou, pelo menos, era isso que sempre lhe ensinaram.
— Ent?o... você quer que eu me vista de forma diferente?
— N?o só isso. — Ele deu um passo em dire??o a ela e baixou a voz. — N?o consigo sentir suas habilidades, Selvagem.
Seu est?mago embrulhou. Ela fez men??o de recuar.
— Sei que está mascarando elas — continuou, sem perder tempo. — Só pe?o que continue fazendo isso enquanto estivermos nas ilhas.
Isla piscou. De novo.
— Ent?o... você n?o quer que eu use meus poderes.
Ela quase caiu para trás. Isso era bom. Era ótimo.
Sorte. Ela teve sorte. Isla estava agradecida e ansiosa. A sorte era perigosa.
Porque, como qualquer elixir raro, estava fadada a acabar.
Ele assentiu.
— Se usá-los, essas criaturas antigas ser?o imediatamente atraídas para você.
Isla se perguntou sobre essas misteriosas criaturas antigas. E por que até o rei de Lightlark queria evitá-las. Fingiu estar magoada, incomodada. Até mesmo com raiva.
— Está bem.
— ótimo. — Ele olhou para as roupas dela e disse: — Isso vai servir.
— S?o pijamas.
Ele apenas a encarou.
Isla queria que o tempo deles juntos terminasse o mais rápido possível, ent?o deu de ombros, rapidamente tran?ou o cabelo e saiu sem sua coroa.
CAPíTULO VINTE E TRêS
TEMPESTADE
Oro caminhou pela mata escura com facilidade, o rei do dia que agora caminhava apenas pela noite. Isla se perguntou se lhe doía estar fora do castelo, lembrando como eram as coisas à luz do sol. Ou talvez já estivesse acostumado com isso.
Quinhentos anos era muito tempo.
Ela n?o lhe perguntou nada enquanto tentava, sem muito sucesso, acompanhar seu ritmo.
Isla presumiu que estavam indo para a pra?a ou para uma das ilhas, mas, antes que pudessem chegar ao vale, Oro fez uma curva brusca para a esquerda.
— Aonde estamos indo? — perguntou.
Oro deu vários passos sem dizer uma palavra. Continuaram pelas colinas verdes do Continente, longe dos ilhéus que desfrutavam a noite. Longe de qualquer trilha.
— Vai me ignorar?
Parte dela queria ficar em silêncio. Realmente n?o importava para onde ele a levasse, contanto que conseguisse o que queria dessa dupla, certo? Mas seu desdém havia se tornado desrespeitoso.
Ele continuou andando, e ela deu uma boa olhada em sua capa dourada, flutuando suavemente com a brisa noturna.
Ela parou, bra?os cruzados.
E, nesse momento, ele também. Suas costas ficaram tensas antes de ele se virar lentamente. Oro abriu a boca, mas ela foi mais rápida.
— Só porque você me pediu para usar isso... — disse ela, gesticulando na dire??o de sua camisa enorme e cal?as de montaria — … e me pediu para n?o usar isso... — e bateu de leve com a unha na coroa dele, o metal tilintando em resposta. Sua unha também fez um estalo dolorido, mas ela n?o se atreveu a sequer estremecer — … n?o significa que eu também n?o seja uma governante de reino. Você vai me tratar com respeito, rei. — Ela cuspiu a última palavra como se fosse veneno.
Poppy teria caído morta ouvindo o jeito que ela se atreveu a falar com o rei de Lightlark. Especialmente pelo que sua tutora a havia ordenado fazer.