Ela é sua inimiga, Terra diria. Um informante havia muito tinha anunciado às suas tutoras que a mais nova da longa fileira de governantes Estelares era uma garota. Uma de vocês vai perder.
Terra convenceu Isla de que, por serem as duas mais novas, elas seriam ca?adas para cumprir parte da profecia. Apenas uma delas sobreviveria.
Deve ser você.
Ent?o, quando acidentalmente Isla abriu um caminho direto para o castelo da governante com sua varinha estelar, e a garota apenas olhou para ela e sorriu, um peso foi tirado de seu peito.
— Acho que a varinha sabia que eu precisava de você — Isla diria a Celeste anos depois, durante uma de suas muitas festas do pijama secretas.
— E que eu precisava de você — respondeu Celeste, apertando a m?o dela com for?a.
Inimigas, n?o.
Amigas.
Irm?s. Essa palavra descrevia muito melhor o vínculo entre elas, um relacionamento para o qual Isla nunca poderia ter se preparado depois de ter passado a vida inteira sozinha. Ela amava Celeste mais do que a qualquer um. Mais, até mesmo, que as suas tutoras.
Era natural que ela contasse seu segredo, três anos depois que se conheceram.
Foi por causa do amor pela amiga que Isla tinha sido sincera.
— Eu entendo se você n?o quiser unir for?as comigo — Isla dissera. — De verdade, Celeste. Eu entenderia.
Celeste a abra?ou com for?a enquanto as duas choravam. Saber sobre a ausência dos poderes de Isla complicava tudo. Saber que havia uma grande possibilidade de os outros governantes descobrirem esse segredo durante o Centenário, e de Isla morrer uma vez que o resto da profecia se cumprisse.
— N?o — sussurrou a Estelar no ombro de Isla depois de um bom tempo. — Vamos fazer isso juntas. Sempre.
Tomando o rosto dela nas m?os, Celeste olhou diretamente para os olhos de Isla e fez uma promessa: — Eu vou proteger você. Nós vamos sair do Centenário vivas e passar o resto das nossas longas vidas juntas.
Foi por isso que Isla deu ouvidos a ela, ou tentou. Celeste tinha colocado a si mesma e todo o seu reino em perigo ao formar aquela alian?a.
E Isla talvez tivesse colocado tudo a perder.
— Sinto muito — disse ela, olhando para o ch?o do quarto de Celeste. Já passava da meia-noite, ent?o ninguém ouviria seus sussurros. Elas mal tinham se visto, sabendo que, se fossem pegas, isso significaria o fim do plano secreto.
Mas, naquela noite, Isla tinha corrido o risco.
Celeste balan?ou a cabe?a. Suspirou. Estava tran?ando seu cabelo prateado apenas para ter o que fazer com as m?os. Sua amiga muitas vezes se ocupava de algo quando estava ansiosa. Antes do Centenário, Celeste havia feito um cobertor por conta do estresse, tricotando por horas a fio, até que Isla, enfim, escondeu as agulhas.
— N?o podemos consertar o que está feito — disse ela, simplesmente.
O silêncio se estendeu, e ele sempre deixava Isla desconfortável. Ela o preencheu com desculpas.
— Quero dizer, eu deveria deixar Grim ganhar? Eu n?o podia. Era isso que ele queria.
Embora seu sorriso após ter sido derrotado tivesse insinuado o contrário...
Ela n?o fazia ideia do que ele queria.
Celeste lhe dirigiu um olhar.
— Você n?o deveria se tornar um alvo.
Isla n?o sabia por que revirou os olhos, mas foi o que fez, subitamente incomodada.
Foi quando a Estelar se levantou. Energia crepitava na sala, um sinal certeiro de que estava com raiva.
— Você precisa pensar no longo prazo — disse ela com firmeza, as m?os fechadas em punhos ao lado do corpo. — Os ilhéus estavam assistindo. Todos os governantes estavam assistindo. Você venceu Grimshaw. Quase derrotou o rei. Pretende fazer inimigos, Isla? Quer se tornar alguém de quem os outros governantes querem se livrar?
Isla desviou o olhar.
— Claro que n?o.
— Ent?o você precisa me ouvir. Nós temos um plano. Participe das demonstra??es sem chamar a aten??o. Seja a governante jovem e inexperiente que eles já acham que somos, ent?o o vencedor das demonstra??es, assim espero, vai nos unir. Isso vai permitir que a gente procure o desvinculador e trabalhe juntas sem ter que esconder nossa alian?a. — Isla se surpreendeu quando a voz de Celeste falhou. Poucas vezes tinha visto Estelar chorar. — Assim vou poder passar um tempo com você sem deixar ninguém desconfiado. Para te proteger. — Uma lágrima prateada escorreu por sua bochecha. Ela deu um suspiro enquanto Isla se dirigia até a amiga, se sentindo envergonhada na hora. — N?o posso protegê-la se você n?o me escuta.
Isla jogou os bra?os ao redor de Celeste, abra?ando-a.
A verdade era que, se a governante Estelar quisesse simplesmente sobreviver e salvar seu reino, teria abandonado Isla. Ela sabia seu segredo, afinal, e seria fácil compartilhá-lo com todos os outros. Garantir que a Selvagem morresse, em vez dela, quando chegasse a hora de escolher um governante para sacrificar.
Mas n?o tinha feito isso. Porque eram irm?s.
Celeste era uma amiga melhor do que Isla merecia.
— Desculpe — disse ela. — Eu prometo, vou pensar no plano. Prometo que vou te escutar.
Mais tarde, Celeste contou que havia procurado na biblioteca da Ilha da Estrela.
— N?o está lá — disse ela. Uma biblioteca cortada da lista.
Uma pontada de decep??o estremeceu no est?mago de Isla. O plano teria sido muito mais fácil se o desvinculador acabasse sendo uma relíquia Estelar.
— Agora vou atrás das luvas — ela disse.
Isla ergueu a cabe?a. Encontrou os olhos de Celeste.
— N?o me olhe assim — continuou baixinho. — Como se n?o soubesse que esse era o próximo passo. — Ela baixou o queixo. — Como se isso n?o fosse ideia sua.
Claro que Isla sabia que essa era a próxima parte do plano. Se o desvinculador n?o estivesse na biblioteca da Ilha da Estrela, elas precisariam de uma maneira de entrar nas se??es protegidas das cole??es das outras ilhas.
As luvas eram cruciais para tanto.
Este tipo particular de acessório encantado era bem conhecido por todos, até mesmo nas novas terras. Luvas que eram capazes de aproveitar um sussurro de poder de um reino. Isla havia pesquisado obsessivamente sobre elas, acreditando que poderiam ajudá-la durante o Centenário. Tudo o que teria que fazer era capturar um pouco da capacidade de Poppy ou Terra de manipular a natureza e usá-las para fingir...
Infelizmente, era perigoso colocar as m?os nas luvas. Diziam que eram feitas de carne humana esfolada. Só os mercados clandestinos nas terras novas ousariam vender uma coisa dessas, e Isla vasculhou quase todos eles.
Eram raras hoje em dia, por n?o serem mais feitas regularmente. Criá-las n?o valia o trabalho. O poder que detinham era mínimo, irrelevante.
A menos que alguém encontrasse um uso muito específico para elas.
Isla tinha sugerido as luvas como último recurso, se precisassem de uma maneira de entrar nas bibliotecas.
— Isla, parece que você vai vomitar — Celeste disse, franzindo a testa.
Ela engoliu em seco.
— Como vai conseguir um par?
Sua amiga a observou. Suspirou.
— N?o fa?a perguntas para as quais n?o quer saber a resposta.
Talvez ela realmente vomitasse.