Especialmente quando sua miss?o pessoal era provar ser mais do que a sedutora que suas tutoras a treinaram para ser.
O primeiro passo no elaborado plano de Terra e Poppy era seduzir o rei. Roubar seu poder fazendo-o se apaixonar por ela. Sem essa etapa, o restante da estratégia era inútil. Isla estava disposta a fazer muitas coisas para salvar seu reino, mas essa n?o era uma delas.
Felizmente, sua amiga havia pensado em outra maneira de Isla conseguir tudo o que queria.
— Bom. Agora, mesmo que as demonstra??es ainda n?o tenham come?ado, quanto antes come?armos a nos preparar para encontrar o desvinculador, melhor — disse Celeste.
O desvinculador. Era esse o plano delas. Em uma sala cheia de manuscritos levados de Lightlark, Celeste havia descoberto um texto sobre uma relíquia encantada. Uma enorme agulha de vidro com duas pontas afiadas, capaz de quebrar qualquer vínculo que aprisionava uma pessoa e sua linhagem, incluindo maldi??es.
Mas tudo em Lightlark tinha um pre?o. E o do desvinculador era sangue.
O suficiente para matar até mesmo um governante. Era por isso que, até onde sabiam, ele nunca havia sido usado antes. No ch?o dos aposentos de Celeste, elas formularam um plano para dividir esse pre?o entre as duas.
E torcer para que aquilo n?o as matasse.
De acordo com o texto, o desvinculador estava escondido nos fundos de uma biblioteca em Lightlark. Elas n?o sabiam qual, e cada ilha tinha a sua própria, ent?o teriam que procurar em todas elas.
Celeste procuraria primeiro na biblioteca da Ilha da Estrela. Com sorte, estaria lá. Caso contrário, a Estelar teria que fazer um grande esfor?o para obter a ferramenta de que Isla precisaria para acessar o restante das bibliotecas.
E, com o cronograma apertado, Isla precisava trabalhar com a possibilidade de ter que fazer isso.
O desvinculador só quebraria as maldi??es dos seus reinos, n?o dos demais. Elas n?o ganhariam o prêmio do poder prometido na profecia. Mas Isla n?o se importava. Ao quebrar a maldi??o de ter nascido sem poderes, ela finalmente receberia o dom Selvagem que lhe foi negado e seu reino se livraria do sofrimento.
Ela poderia voltar para a nova terra Selvagem, finalmente livre, sem precisar ficar escondida no quarto. Isla poderia injetar energia de volta no solo e fazê-lo prosperar mais uma vez, teria a vida de uma governante imortal e séculos para explorar o mundo com Celeste.
Tudo que Isla queria dependia do desvinculador e de seu poder de quebrar todas as maldi??es que afligiam a ela e ao seu reino.
— Vou come?ar hoje à noite.
Para procurar em segredo nas bibliotecas das ilhas do Sol, da Lua e do Céu, Isla precisava se misturar.
O cabelo escuro seria a primeira coisa a entregar sua identidade. Mas ela veio preparada. Antes de partir para o Centenário, havia se esgueirado pelos aposentos de Poppy. Os elixires dos Selvagens variavam de remédios curativos a encantamentos e produtos de beleza. Cremes que tingiam os lábios, bochechas e, mesmo que temporariamente, cabelos.
Ela mesma teria que misturar a cor certa, o que seria um desafio por si só, mas pelo menos tinha os apetrechos.
A roupa era o outro problema.
Bem depois da meia-noite, Isla saiu do castelo. Memorizou alguns pontos pelo caminho: o mosteiro com um enorme vitral, a insígnia por onde havia chegado apenas alguns dias antes, ruínas que gostava de pensar terem sido um farol, movido por raios dos Solares. Ela havia lido sobre esses lugares em um dos poucos livros que lhe permitiam ler a cada ano.
Terra entendeu logo que ela gostava de ler, ent?o usou livros como incentivo. Se Isla n?o reclamasse dos dedos machucados ou do corpo dolorido durante o treinamento, se dominasse as técnicas de luta, se acertasse as estrelas de arremesso nos alvos, era recompensada com uma ida à biblioteca.
Isla apreciava os livros, anotava suas passagens favoritas no papel e sentia uma espécie de luto quando era obrigada a se desfazer deles em troca de outros.
Apenas um livro de cada vez, sua tutora dizia. N?o seja gananciosa.
Ela parou bem perto da pra?a. A surpresa a deixou imóvel.
O mercado se transformou depois que o sol se p?s. A maioria das lojas estava fechada, as janelas escuras, mas as que estavam abertas estavam... abertas. Exatamente como a anci? Selvagem havia descrito.
De alguma forma, algumas das lojas tinham sido viradas do avesso, as paredes desdobrando-se nas ruas, sem portas à vista, o teto esticado como um leque. Clientes andavam livremente dentro de bares e, momentos depois, fora deles, segurando copos transbordando de bebidas espumantes. Etéreos dan?avam no meio da rua ao som da música que se espalhava pela noite, bateria e viol?o e vozes que for?avam a escurid?o a obedecer a seu ritmo agitado. Os Solares eram manchas douradas em todos os lugares, aproveitando as horas que podiam estar lá fora.
A pra?a estava animada e confusa, mas Isla se lembrava das ruas por onde havia passado mais cedo. Ela tomou um caminho entre as lojas, escolhendo becos em vez de ruas principais, seguindo as fileiras de tochas acesas até que chegou à porta dos fundos do alfaiate.
Todas as luzes estavam apagadas. Todas as janelas estavam trancadas.
Depois de confirmar que n?o havia outro jeito de entrar, ela se ajoelhou e tirou um de seus grampos. Em uma viagem com a varinha para a terra nova dos Etéreos, a garota havia seguido um grupo de ladr?es, curiosa. Tinha assistido das sombras enquanto eles usavam grampos e agulhas curvas para destrancar uma fechadura.
Foi uma habilidade útil para invadir os quartos de Poppy e Terra. Para escapar de seu quarto também.
A porta se abriu e Isla juntou suas ferramentas, tomando cuidado para n?o deixar nada para trás. Ela apertou os olhos na escurid?o, sem se atrever a acender qualquer uma das luzes. Uma alfaiataria n?o seria normalmente um lugar visado por ladr?es, portanto os guardas n?o estariam prestando particular aten??o. Mas quem sabe quanto tempo iria levar para alguém aparecer no beco e vê-la pela janela?
Rápido. Seus olhos se concentraram nas cores de que precisava, todos os tons dos reinos de Lightlark, exceto os Estelares, que Celeste resolveria.
Branco. Ela pegou um vestido Lunar simples, de manga comprida e gola alta.
Azul-claro: um vestido com cal?a que, aparentemente, deveria ser usada por baixo, algo que tinha visto alguns Etéreos usarem no mercado.
Dourado.
N?o havia dourado na loja. Refletindo naquele momento, realmente n?o se lembrava de ter visto a cor na loja durante sua estada.
Os Solares n?o usavam o mesmo alfaiate que o restante dos reinos?
Por que n?o?
Uma voz na janela fez com que ela se deitasse no ch?o. Dois amigos estavam encostados do lado de fora da loja, rindo alegremente e brindando. Ela se esgueirou contra a parede e ficou encostada ali, decidida a n?o fazer barulho.
Meia hora se passou antes que os homens saíssem, e logo depois Isla se foi, tomando o cuidado de fechar a porta ao sair, torcendo para que o alfaiate pensasse que havia se esquecido de trancá-la.
Carregada de seda, ela voltou para o castelo, um passo mais perto do desvinculador.
CAPíTULO SETE
DUELO