— Isla, ainda que o sangue em seus lábios combine com você, posso notar a avers?o do meu bom amigo Azul aos prazeres dos Selvagens... — De fato, o Etéreo, embora tentasse ser educado, parecia passar mal. Grim fez sinal para um dos criados. — Por favor, envie o prato para os aposentos dela.
Ele falou como se aquele fosse o seu castelo, n?o o de Oro. O governante Solar piscou, mas n?o impediu que o garoto Etéreo levasse o prato de Isla.
— Est?mago fraco, Grimshaw?
O Umbra sorriu, a covinha retornando.
— Todos nós temos nossas fraquezas, Oro — ele disse. — Estou contando com elas.
De alguma forma, Isla conseguiu passar o resto do jantar sem ter que pedir licen?a.
Ent?o, passou a noite vomitando sangue.
CAPíTULO QUATRO
REGRAS
Isla nasceu sem a maldi??o dos Selvagens e sem o poder deles.
Desde que nasceu, viveu trancada. Protegida por Poppy e Terra, por medo de que o reino descobrisse seu segredo.
Sua m?e era a culpada. Ela quebrou a regra mais importante dos Selvagens: se apaixonou. E depois n?o conseguiu matar seu amado. Terra e Poppy sempre disseram que havia consequências em quebrar as regras... e que, n?o importava como, maldi??es sempre encontravam seu sangue. O pai assassinou a m?e de Isla momentos depois do parto, e a menina n?o tinha poderes. Uma maldi??o própria, como consequência por sua m?e ter, de alguma forma, impedido a original. Isla n?o precisaria comer cora??es ou matar seus amantes. Mas ser uma governante nascida sem poderes era t?o perigoso quanto.
Esperava-se que os governantes depositassem seu poder em suas terras para manter o povo forte. Era assim que Lightlark se mantinha t?o cheia de energia, e como os reinos sobreviveram nas terras novas depois de terem fugido da ilha. E, sem poder para dar, Isla estava matando seu reino. Até agora, seu povo havia culpado as maldi??es e o tempo longe de Lightlark pelas mortes. Mas alguns já come?avam a suspeitar dela.
Esse era seu maior segredo. E seria uma senten?a de morte no Centenário.
Um dos seis governantes tinha que morrer para quebrar as maldi??es, de acordo com a profecia do oráculo. Mas era pior do que isso. O poder de um governante era a for?a vital de seu povo. Ent?o, se algum deles morresse sem um herdeiro...
Todo o seu povo morreria junto.
Era isso que estava em jogo. Quebrar as maldi??es significava eliminar um reino inteiro.
O primeiro Centenário tinha sido um massacre. Todos os governantes convidados tentaram matar uns aos outros, e muitos dos ilhéus foram pegos no fogo cruzado. Mas os chefes dos reinos eram muito habilidosos, já muito antigos, e os cem dias terminaram com todos vivos e as maldi??es intactas. Depois disso, ficou decidido que os próximos Centenários teriam regras.
Oro estava nos degraus em frente ao seu trono dourado, em pé em vez de sentado nele. Essa foi a primeira coisa que Isla notou ao entrar no grande sal?o. Os líderes pareciam estar lembrando constantemente as pessoas em volta de sua autoridade. Durante suas poucas visitas a nova terra Lunar, ela vira inúmeras estátuas de gelo esculpidas à semelhan?a de sua governante, ouviu Lunares conversarem sobre pagar seus impostos, viu a patrulha que Cleo mantinha perambulando constantemente pelas ruas.
Havia uma raz?o para o rei hesitar se sentar ao trono?
A outra coisa que ela percebeu foi a meia dúzia de candelabros de fogo, sobrepondo-se no teto. Eles reverberavam as chamas de quatro lareiras, que queimavam fortemente. Ela se lembrou do comentário de sua criada: o rei n?o queria nenhuma das lareiras apagadas.
Por que n?o?
Os governantes se reuniram em um círculo, e Isla ficou de pé, ignorando a pontada de fome no est?mago. Ela havia se infiltrado nas cozinhas naquela manh?, mas tudo o que conseguiu foi p?o, uma fruta que lembrava vagamente mura da terra dos Selvagens e uma xícara de leite. Seria necessária uma solu??o de longo prazo para seu problema alimentar.
Celeste, do outro lado do círculo, parecia bem descansada, com a pele vibrante. Isla imaginou que sua amiga tinha visitado a Ilha da Estrela pela primeira vez naquela manh?, onde talvez tivesse ocorrido uma cerim?nia em sua homenagem. Sem acesso regular aos seus líderes, os Etéreos, Estelares e Lunares que permaneciam em Lightlark tinham criado seus próprios subgovernos. Seus governantes máximos passaram a ser vistos quase como deuses, chefes de fachada a quem se submetiam e viam por apenas alguns meses a cada cem anos. Durante o Centenário, todos os governantes tradicionalmente passavam a maior parte do tempo no Continente, mas havia algumas exce??es.
Isla sempre se perguntou como eram as diferentes ilhas que compunham Lightlark. Ela ansiava perguntar a sua amiga sobre tudo isso e desejava saber como usar sua varinha estelar entre pequenas distancias para que pudesse simplesmente aparecer no quarto de Celeste quando quisesse. Mas teriam que se contentar em usar os corredores. Além disso, se encontrar muitas vezes, t?o cedo no jogo, era um risco grande.
Ela se virou e acabou cruzando o olhar com o de Cleo. A Lunar a observava com muito interesse. Um predador avaliando sua presa, com um brilho afiado.
Isla pagaria por seu comentário na noite anterior, tinha certeza disso.
Oro finalmente falou:
— Vamos come?ar declarando as regras do Centenário.
O ar estava elétrico, zumbindo de energia.
— A primeira regra: um governante n?o pode assassinar ou tentar assassinar outro governante até depois do quinquagésimo dia. — A regra era um alívio para Isla. Por pelo menos metade do Centenário, sem poderes ou n?o, ela estaria segura. Era por isso que ela e Celeste planejavam estar fora da ilha antes mesmo do baile que iria acontecer no quinquagésimo dia. — E, quando os pares forem decididos, no vigésimo quinto dia, um governante n?o pode assassinar seu parceiro.
Após o caos do primeiro Centenário, os cem dias foram divididos em partes e tornaram-se mais estruturados. Os primeiros vinte e cinco dias eram dedicados a demonstra??es feitas por cada governante, projetadas para testar os pontos fortes de cada um e o quanto mereciam permanecer vivos. Cada teste tinha um vencedor. O governante que vencesse o maior número de testes decidiria em quais pares os governantes seriam divididos pelo restante do Centenário.
— A segunda regra: todos os governantes devem comparecer e participar de todos os eventos do Centenário.
Essa regra parecia inócua, mas era perigosa, dependendo do acontecimento.
— A terceira regra: para participar, nenhum governante pode ter um herdeiro. — Desta forma, sua morte eliminará sua linhagem familiar e quebrará as maldi??es, segundo a profecia. Também significa o fim de seu reino para sempre.
Cada governante recebeu um convite para o Centenário contendo essas regras. Aceitar o convite significava concordar com as três ordenan?as.
E toda boa promessa era selada com sangue.
Com o movimento do pulso do rei, um fogo irrompeu no meio do círculo. Isla sabia exatamente o que aconteceria a seguir.
Poppy a fez praticar, de novo e de novo, até você n?o vacilar! Sua ferida era costurada, apenas para ser aberta de novo e de novo e de novo, até que ela n?o tivesse nenhuma rea??o visível à dor.